Com menta naquele lugar. É bom.

terça-feira, 13 de novembro de 2007

O cinema e as flores.


Domingo, dia 11 de novembro de 2007.

Acordo com o telefonema de minha tia dizendo que minha prima já estava no banho e que em breve, ia se encontrar comigo. Acordei desesperado, direto pro banheiro, tomei um rápido banho, me arrumei, fiz um copo de Nescau, com uns pães de queijo no forno. Bebi o nescau antes que os pães ficassem prontos, e eles ficaram prontos, mas já tinha perdido a fome e voltei pro banheiro, escovei os dentes, peguei a identidade e fui pra frente do meu condomínio.
Tava nublado o dia, e senti um leve frio, voltei correndo para casa, enquanto minha prima me esperava no banquinho de frente pro prédio, e busquei o cigarro.quando voltei, lembrei que ainda estava com frio e voltei pra casa pra pegar minha jaqueta de tenente. Num clima de descontração, enquanto esperávamos uma amiga de minha prima, um grito ecoa entre as àrvores do local, e avisto um besouro na minha jaqueta, dando-lhe um chute no qual "voa-voa-voa" besourinho. A menina chega, e pegamos uma carona com o sogro desta.
Ao chegar, uma multidão de jovens com camisetinhas de cursinho de vestibular coloriam a rua do local da prova. Nervoso(tenho um grave problema com multidões), imediatamente acendo um cigarro, aos olhares da "playboyzada". Enquanto minha prima, cujo o nome é Flávia, conversava com uns amigos do cursinho, eu pensava no que estava fazendo ali, talvez o único que até o momento não tinha pêgo num livro pra estudar, e ainda estava ali, de peito aberto pro desse e viesse, e logo, acendi outro cigarro.
Tinha sido meu primeiro vestibular. As duas últimas provas que tinha feito era da FAETEC e da Escola de música Vila-Lobos. Ansioso, apreensivo, nervoso, e calmo ao mesmo tempo. Muitas gurias bonitinhas, e todas me olhavam com cara de espanto, por causa da minha jaqueta. Com menos de 5 metros da porta, acendi meu terceiro cigarro, desde que tinha chegado ali, eu sabia que não daria tempo pra fuma-lo, mas mesmo assim decidi acender, pois quando se está nervoso, qualquer lugar onde você pode se esconder, é válido. E naquele estado, o cigarro era meu esconderijo.
Cheguei na portaria, apaguei o cigarro no muro e o joguei no chão, tinha dado menos de cinco tragadas no coitado. O nervosismo só aumentava, minhas mãos suavam, uma rápida vontade de cagar passou como flash, e me despedi de minha prima no qual ia fazer prova numa sala diferente, infelizmente. Subi as escadas tenso. Nunca tinha estado ali. Com o papel de inscrição na mão fui me teleguiando até minha sala. ao chegar na porta, uma guria com uma camisa da UFRJ peguntou se eu já tinha ido ao banheiro e bebido água. por um momento refleti se era melhor eu ir no banheiro antes da prova, até porque seriam cinco horas de prova, e aquele flash aos pisar na escada era um sinal, que coisa boa durante aquelas cinco horas não viriam. Olhei em minha volta e avistei um bebedouro, bebi uns goles d'água e entrei na sala. tentei não pensar no pior, e esqueci do flash que senti ao pisar na escada.
Deixei minha identidade com uma outra guria dentro da sala e peguei os cartões resposta, olhei em minha volta e todos me olhavam. Era minha jaqueta. Avistei um lugar na última carteira da segunda fila. Só senta nas últimas carteiras quem são os mais inteligente( para que ninguém cole de você), e os mais burros (para que você cole de todos sem ser visto).
Eu não tinha material pra fazer a prova. Tinha uma caneta, e nem sabia se ela estava boa ou não. quando estava na parte de fora, fumando meu cigarro, minha prima e sua amiga me emprestaram uma caneta com uma tampa de sapinho, um lápis e uma borracha muito pequena. Preparei meu fragmentado material, e fiquei olhando pro nada esperando a maldita prova, e enquanto isso a sala enchia.
Todos que entravam na sala, pareciam muito inteligentes, com suas camisas de cursinho de vestibular, e eu lá no fundo, com minha jaqueta de tenente e suas três estrelas no ombro. Em minha volta, muitas gurias bonitas, se preparavam para a prova, todas com algum tipo de comida em cima da mesa. Barras de chocolate, biscoitos, garrafinhas d'água, doces entre outros aperitivos. Foi quando por um momento olhei o trakinas em cima da mesa de um rapaz. Trakinas me lembra chocolate, que me lembra sede, que me lembra água, que lembra que depois de dez minutos comendo trakinas e bebendo água você sente dor de barriga, e foi desse pensamento filosófico-recordativo, que me veio o flash pela segunda vez.
Com um rádio de patrulha na mão, me entra uma gorda, parecia ser fiscal, com um saco lacrado na mão gritando num tom imperativo "olha, as provas estão lacradas". Só faltava terminar a frase com um "porra!". Eu estava esperando por aquilo, mas não foi como eu queria. Ela deixou as provas com as assistentes bonitinhas e saiu da sala. Se quer olhou para aqueles pobres vestibulandos.
Enquanto uma das assistentes entregava as provas, outra escrevia no quadro numa letra muito feia, que não era permitido copiar o gabarito da prova. Eu tava pouco me fudendo para tudo aquilo. Eu queria sair daquele inferno o mais rápido possível.
Pego minha prova, e inicialmente não sei o que fazer. Tento ler, mas leio, leio, leio e na verdade não leio nada, estava viajando. Dentro de mim mesmo, dou um tapa na cara da minha inconsciência e acordo. Leio a prova. Prefiro fazer as questões de biologia. Não entendo porra nenhuma que ta escrito. Nunca tinha estudado aquilo. Repito o enunciado, como havia aprendido com os amiguinhos do cursinho, e tento enrolar na questão. Me dou conta que estaria fudido. Parto para as questões de português, e quando percebo, perco a borrachinha. Só pra me fuder.
Nunca vi uma prova de português tão difícil na vida. O tema falava sobre cinema. Por acaso, algo que adoro. o Flash volta. Olho pro lado e uma menina ja estava fazendo a redação. Achei melhor deixar a redação por último, pois eu tinha cinco horas. Parto para as questões de matemática. Olho pra sala e incrívelmente todos olham para suas provas concentradíssimos. Ninguém olha pro lado. Só eu. Fico com medo, sinto um grande frio e me vem o Flash. Achei que estivesse surtando, mas percebi que o frio que sentia era do ar condicionado na sala. Me concentro na prova, e quando me vejo, estou pensando na festa que tinha ido no dia anterior. Tinha enchido a cara no aniversário de um amigo, até cantei mensage in a bottle, do the police com uns amigos, e toquei baixo em algumas músicas. Volto a fazer a prova.
Química me preocupa. Não tinha nada na prova que eu sabia. Deixo pra depois. Parto pra redação. Já que tinha perdido a borracinha, eu nem no rascunho poderia errar, porque assim, não poderia apagar, e se eu rasurasse, eu poderia me perder, e estragar a redação na hora de passar à limpo. Começo a relacionar os temas que iria falar na redação. A redação era sobre cinema e a questão social. Moleza pra mim.
Começo a redação escrevendo na mesa, falando de chaplin e o cinema mudo. Misturo um pouco de marxismo barato, faço uma sátira com estações do ano e guerras mundiais, e finalizo o segundo parágrafo com cinema porco-hollywoodiano.
Parto pro terceiro parágrafo ressaltando Glauber rocha e o cinema novo. Achei que poderia ganhar pontos, falando de algo tão pouco conhecido e valorizado no cénario cinematográfico nacional. Aponto as "pornô-chanchadas" como uma tática da ditadura militar de apaziguar o clima tenso do cinema novo e termino o terceiro parágrafo com verões e invernos de guerras.
Volta a falar de nordeste seco, miséria e repressão com Sergio bianchi e dou uma leve pitada de sal com o velho marxismo barato, terminando assim o quarto parágrafo.
Concluo a redação relacionando a importância do cinema nos momentos de tensão política, e as estações do ano com os conflitos ideológicos. e finalmente passo a limpo a redação.
Volto para a questão de química, e começo a tentar colar alguma coisa. O meu maior medo, e o de todos naquela sala, era de zerar a alguma matéria, e por consequência, a prova.
Consegui colar algumas coisas, mas ainda era pouco. Uma das assistentes avisa que falta uma hora para o término da prova. Bate um desespero. Nem dos Flashs eu lembro mais. Começo a passar a limpo todas as respostas e invisto na malandragem, eu tinha que conseguir alguma coisa.
A assistente anuncia quinze minutos para o término da prova, e eu desesperado, arranjo um nome para minha fantástica redação: "O cinema e as flores".
Uma menina que estava do meu lado foi a cobaia. tudo que via eu copiava, foi ai que descobri que apesar de estar usando óculos, eu estava ficando cego. Percebo que a assistente me vê colando. ela olha pra mim muita vezes, e eu a encaro, como se nada tivesse acontecido. Bate um arrependimento ao olhar pra ela( a assistente). Nunca olhe nos olhos do professor quando for colar, senão ele vai perceber que você ta desesperado, e ta tentando colar. Por alguns segundos reflito sobre o fato da assistente estar me olhando demais. Imagino primeiramente na cola, depois penso na jaqueta, e por último penso na hipótese de que ela esteja me dando mole. Continuo tentando colar. Ela já sabia que eu estava colando, e não esboçava nenhuma reação. ela tava deixando eu colar, e numa encarada, ela esboça um sorriso tímido de lado. Fico com medo. Ou ela ia me fuder a qualquer momento, ou ela gostou de mim. Ou de minha jaqueta. quando faltava cinco minutos para o término, a menina do qual eu colava se levanta, e eu respectivamente na cara de pau, me levanto. Entrego a prova e a guria que me encarava me pergunta o nome:

-Diego.
-o que?
-Diego cesar.respondo.

Enquanto isso a outra assistente procurava minha identidade num amontoado de personalidades sobre papel verde. Ela acha e antes que ela olhasse minha foto, eu pego de sua mão e dou as costas. Saio da sala apreensivo. Bebo um pouco de água, e desço as escadas. Pego meu maço e há um único cigarro. bate uma tristeza. Não sabia se era porque tinha apenas um cigarro ou se era pela prova. Um sol forte bate nos olhos, o suor desce e acendo o cigarro. Esperava por minha prima ao lado do portão. Todos me olhavam. Era a jaqueta. Vejo uns rapazes fazendo um comentário de mim, eles chegaram a disfarçar, mas foram incopetentes. Eu percebi. Vejo que minha prima não ia aparecer tão cedo e vou para a casa da minha vó, que era perto. Olhando minha imagem refletida nos vidros dos carros, com o cigarro na boca e a certeza que tinha me fudido na prova.