Com menta naquele lugar. É bom.

domingo, 24 de maio de 2009

Vermelho cor de sangue - Parte 2

Correu até a porta, parou e pensou. Só de calça, descalço, descabelado e sem camisa. Era assim que pensava em ir até a rua forjar seu encontro casual com a jovem guria. Por cinco segundos desistiu, mas o desejo já subia sua cabeça, e correu até o quarto peg a camisa que vestira ontem. Calçou um chinelo e pegou algumas moedas e a chave. Desceu.
Correr era pouco, logo pulava os degraus da pequena escada que o levava ao estreito portão e assim caiu eufórico na rua. Ela havia sumido em alguma esquina. Uma escolha errada e seria em vão toda a correria. No cruzamento escolheu a rua da direita. Caminhando rápido, fez a curva decidido e quando já ensaiava o que lhe diria, se deparou com a longa e triste ladeira vazia. À sua frente só portas e garagens. Muros de todas as cores, nenhuma garota. Ninguém.
Voltou para seu ateliê disfarçado de apartamento, ou vice-versa, e fumou um cigarro sentado no vazo. Olhando para o azulejo, pensando no nada, apenas olhando por olhar, pensando na guria. Saiu do banheiro, pegou um pouco de tinha vermelha e azul e jogou sobre uma tela limpa. Com a mão, esfregava toda aquela mistura na tela com uma certa raiva, decepcionado, e num estado fora de si, levou as mãos à cara. Foi ao banheiro, se olhou no espelho e riu. Se sentia um rapaz de 17 anos e achava graça de tudo aquilo. Entrou para o banho e foi atrás de algo para comer na rua.
Dava dez e meia da manhã no relógio redondo que tinha pendurado na cozinha, e Carlos comia um pedaço de pizza gelado que estava em sua geladeira, de três dias atrás. Comia e tentava se lembrar do sonho que tivera. Alguma coisa relacionada a fuga, lugares desconhecidos e visão embaçada. Sensação de medo ao acordar e boca seca, abria os olhos o máximo que podia, para tirar a sensação de estar cego.
Vestiu uma camisa pólo vermelha, pegou o bondinho sobre o sol de 11 horas e foi até o Centro do Rio para comprar mais material para seu ateliê, e aproveitaria, faria o que mais gostava de fazer quando um tanto deprimido, ver pessoas. A sexta-feira lhe dava uma sensação de que algo velho tinha ficado para atrás e, consequentemente, alguma coisa nova ele seria obrigado a conquistar. Sexta-feira em sua cabeça era sinônimo de mudança. Pensava nessa mudança olhando para o Cristo, de braços abertos, com o sol em sua face e sem fazer uma sequer careta. Deus não é careta, pensou. Tomou rumo ao 'amargo lar'.



terça-feira, 5 de maio de 2009

Vermelho cor de sangue - Parte 1

“Entrando naquele quarto( um pouco atordoado), onde as paredes eram sujas de poesia, encontrei a famosa 'branca' esquecida no chão. Cocaína. O abajour dava um tom meio amarelado àquele ambiente, que propiciamente, me conduziu à cama, onde traguei minha 'branquinha'. A cocaína que me refiro, era a vizinha”.


No final de outrubro, Carlos alugou um apartamento no Centro do Rio, para poder se dedicar ao trabalho. Era artista plástico, e pretendia fazer uma exposição dalí a três meses. Pelo fato de não conseguir associar a vida que levava de "socialzinha" na casa dos amigos bem sucedidos, isolou-se em uma rua muito tranquila de Santa Tereza para poder se dedicar ao que mais gostava de fazer, pintar, e como tanto almejava, expor suas obras, para necessariamente não ser mais julgado de "o artista que tinha como ápice de criação seu caixão pintado por si". Em seu novo e temporário lar, foi se familiarizando com a vista que dava para os trilhos do bondinho, que por sinal passava inumeras vezes, o tirando a atenção. Atenção que tirada o tranquilizava da dor de cabeça por não conseguir achar a inspiração para seu último quadro. Aos poucos, a pequena sala foi se enchendo de telas, tintas, pincéis, rasuras e garrafas de vinho. Nada de conseguir pintar o quadro pra fechar o acervo. Uma quarta-feira ensolarada, Carlos acordou um pouco mais cedo por causa de um pesadelo. Com sede, foi à geladeira beber um pouco de água e matar aquela leve ressaca. Acendeu um cigarro, com o copo d'água foi até a varanda ver o bondinho passar. Olhando com dificuldade decorrente do soco que levava do sol em sua vista, dolorosamente avistou uma mulher que caminhava com uma sacola cheia de verduras e frutas, e um jornal de baixo dos braços, olhando para atravessar a rua, também com dificuldades de enxergar por causa da claridade que tinha em seus olhos. Uma rosa no cabelo, pele suave e levemente dourada. O vestido um tanto justo ao corpo, com decote admirável, e o rebolado de uma menina tímida na passarela das ruas cariocas. Carlos não acreditava em amor a primeira vista, muito menos no amor, mas naquele momento, com sua água e cigarro nas mãos, sentiu a maior sede de sua vida. Uma vontade súbita de beber aquela mulher, literalmente beber aquela mulher. Sua sede era até o momento, insaciável.